As operadoras de planos de saúde tentam no Supremo Tribunal Federal (STF) uma última cartada para não pagar o Imposto sobre Serviços (ISS). Com jurisprudência desfavorável no Superior Tribunal de Justiça (STJ), todas as atenções do setor, que movimentou R$ 84,4 bilhões no ano passado, voltam-se para um recurso apresentado por um hospital de Marechal Cândido Rondon, no interior do Paraná, que será julgado por meio de repercussão geral.
No STJ, as duas turmas especializadas em direito público entendem que os planos de saúde devem ser tributados pelos municípios. Porém, o imposto deve ser recolhido apenas sobre a “taxa de administração” recebida – a diferença entre o valor pago pelos consumidores e o que é repassado para os prestadores de serviços (hospitais, clínicas, laboratórios e médicos).
As empresas defendem que a atividade tem natureza securitária e tentam escapar das alíquotas do ISS, que variam de 2% a 5%, dependendo do município. “O plano de saúde atua como uma seguradora e não deve ser tributada pelo ISS”, diz o presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), Arlindo de Almeida. “É uma grande causa, que acompanhamos com preocupação.”
Em recente julgamento na 2ª Turma do STJ, no entanto, o argumento do setor não foi aceito pela maioria dos ministros. O relator do caso, ministro Herman Benjamin, entendeu que “inexiste, a rigor, discussão quanto à legislação federal, que prevê expressamente a exação, nos itens 4.22 e 4.23 da Lista Anexa à Lei Complementar nº116, de 2003”, que dispõe sobre o ISS.
Para o ministro, a base de cálculo seria ainda maior. O imposto municipal deveria incidir sobre a receita bruta, sem qualquer desconto. “Esse entendimento foi por mim defendido na 2ª Turma, mas acabei vencido”, afirma na decisão. “O colegiado ratificou a jurisprudência da 1ª Turma, no sentido de que a base de cálculo do ISS sobre planos de saúde é o preço pago pelos consumidores, diminuído dos repasses feitos pela contribuinte aos demais prestadores de serviços de saúde.”
O caso analisado pela 2ª Turma do STJ envolve o município de São Paulo, que pretende ingressar como “amicus curiae” no recurso a ser analisado pelo Supremo. “Queremos auxiliar o STF na tomada da decisão. A jurisprudência reconhece que há efetiva prestação de serviço, a ser tributada nos termos da Lei Complementar nº 116”, diz o procurador-diretor substituto do Departamento Fiscal da Prefeitura de São Paulo, Eduardo Yoshikai.
Desde meados do ano passado, segundo o procurador, o município de São Paulo utiliza a base de cálculo reconhecida pela jurisprudência do STJ. A mudança veio com a edição da Lei nº 15.406, que alterou o artigo 14, parágrafo 11, da Lei nº 13.701, de 24 de dezembro de 2003.
No Supremo, os planos de saúde apostam em uma reviravolta. O relator do caso é o ministro Luiz Fux, que chegou a analisar a questão no STJ. Em 2008, ele entendeu que o tema seria constitucional e, portanto, deveria ser julgado pelo STF. Fux foi seguido à unanimidade pelos ministros da 1ª Turma, que conheceram parcialmente do recurso apresentado por uma clínica médica gaúcha, mantendo apenas reduzida a base de cálculo do ISS. O único precedente do Supremo é de 1988, anterior à Lei Complementar nº 116 e à Lei do Planos de Saúde – nº 9.656, de 1998.
Uma eventual decisão do Supremo contra a cobrança de ISS poderia abrir espaço para a União tributar as atividades dos planos de saúde, caso os ministros entendessem pela natureza securitária da operação, de acordo com o advogado Guilherme Broto Follador, do escritório Assis Gonçalves, Kloss Neto e Advogados Associados, que defende o hospital paranaense. “Mas seria necessária a edição de uma lei nesse sentido”, diz.
Para o advogado Rodrigo Forcenette, do escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia, deve prevalecer no Supremo a tese de que as operadoras de plano de saúde, inclusive as cooperativas, não prestam serviços. “Nos contratos que celebram, apenas garantem que os serviços médico-hospitalares serão prestados”, afirma.
Arthur Rosa – De São Paulo