O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou nesta quinta-feira (7) jurisprudência segundo a qual não é cabível a utilização de habeas corpus para sanar questões relativas a direito de família, como a guarda de menores, por exemplo. O entendimento foi ratificado durante o julgamento de três processos (Agravos Regimentais nos HC 99945 e HC 101985 e RHC 102871) relativos ao caso Goldman, em que a avó do garoto S.R.G. questionava o fato de ele ter sido entregue ao pai americano sem ser ouvido por um juiz brasileiro.

Ao analisar o caso, o Plenário decidiu, por maioria de votos, negar provimento ao RHC e também a dois recursos (agravos) apresentados nos Habeas Corpus. Ficou vencido o relator, ministro Marco Aurélio, que votou pelo provimento dos apelos apresentados pela avó do menino. O ministro considerou prejudicado um agravo do pai biológico, que pretendia assistência. O voto do ministro Marco Aurélio assegurava o prosseguimento dos HCs para que o mérito fosse analisado pelo Plenário da Corte sob o argumento de que o HC “é meio hábil para questionar o direito de liberdade de ir e vir da criança”.

A maioria dos ministros, no entanto, seguiu o voto do ministro Gilmar Mendes, que votou no sentido de negar provimento aos recursos. Em seu voto, ele lembrou o julgamento da APDF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 172, em que o STF arquivou o pedido do Partido Progressista (PP) que pretendia impedir a entrega do menor “de forma abrupta”. Na ocasião, os ministros concluíram que existem outros instrumentos processuais cabíveis para se questionar a aplicação da Convenção de Haia, que trata do sequestro de crianças, o que inviabilizou a análise da ADPF.

Na sessão desta quinta-feira (7), o ministro Gilmar Mendes afirmou que “outra inteligência subverteria toda a ordem jurídico-processual, permitindo trazer diretamente a esta Corte, sem observância dos graus de recursos, causas que não cabem na sua competência originária e que são de descendência constitucional”. O ministro destacou informações da perícia que foi feita sobre o caso, mostrando que a criança, na época, tinha momentos de instabilidade sobre sua preferência ou não de permanecer no Brasil, e destacou que o procedimento foi feito com a observância do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

Ao seguir esse mesmo entendimento, o ministro Ricardo Lewandowski esclareceu que “existem, não apenas na legislação civil, mas especificamente no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), medidas cautelares hábeis para solucionar controvérsias dessa natureza”. O presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, também seguiu o voto do ministro Gilmar e acrescentou que “a via processual do habeas corpus é inadequada para a tutela do direito pretendido pela impetrante, seja em razão da inviabilidade de realização de minucioso exame de provas e de matéria de fato, seja pela impossibilidade de utilização do habeas corpus como sucedâneo de recurso”.

Preliminar

O ministro Teori Zavascki chegou a sugerir que, preliminarmente, o Plenário declarasse a prejudicialidade dos HCs, uma vez que o menor já foi entregue ao pai biológico e tais processos perderam o objeto, ou seja, a razão do pedido. Porém, como essa preliminar foi superada, no mérito ele seguiu o voto do ministro Gilmar Mendes, negando provimento aos recursos. A decisão foi por maioria, vencido o ministro Marco Aurélio.

Argumentos da defesa

De acordo com a advogada de Silvana Bianchi, avó do garoto, ele teria sido compelido a sair do Brasil sem que tivesse o direito de se manifestar, pois não foi ouvido diretamente pelo juiz. Sustentou ainda que a Advocacia Geral da União (AGU) defendeu a entrega do menino ao pai biológico com base na Convenção de Haia, mas, dessa forma, teria negado o preceito da própria Constituição Federal que prevê a convivência com a família. Nesse sentido, alega que S.R.G. foi tratado como um “objeto ou uma coisa”, mas que hoje já é um rapaz “prematuramente amadurecido” pela morte de sua mãe e por ter perdido a convivência com sua avó e sua única irmã, que moram no Brasil. Além disso, sustentam que as autoridades americanas têm tolhido o direito da avó de ver o neto. Com esses argumentos, a defesa pretendia que o STF declarasse a ilicitude da decisão que permitiu que o garoto fosse para os Estados Unidos, declarando consequentemente o repatriamento de S.R.G.